O último suspiro

O último suspiro

 

O último suspiro 
 
   É um arrepio inexplicável, ele passa no topo da coluna, por cada poro da minha pele e chega até os dedos dos pés, porém antes ele tinha passado pelo meu coração. A razão fica um pouco ofuscada, apesar de ainda existir em mim. Cada nota vinda daquela voz, cada melodia e os jeitos corporais provocam-me uma sensação  inenarrável. 
   A bailarina soltou os seus cabelos,  deixou fluir as pernas no ar e o vento dos braços dançantes esvoaçaram a gana da dança, da arte. Os pulos fizeram com que o coração saltasse. Naquele momento pensei que fosse flutuar junto com a bailarina. Quase como efeito especial de cinema, ela girou apoiada apenas com o dedão do pé, a música do fundo conseguiu alcançar os passos, as rodopiadas e os saltos duplos. Seu parceiro demonstrou bravura e carinho por ela, por ele e por mim. 
   Aquela não foi só mais uma apresentação, não foi uma dança coreografada, foi a dança pela vida, pelo momento único que jamais voltaria. Por mostrar o quanto a morte é valiosa, o quanto a vida é única e como um simples gesto consegue marcar um momento. montante de detalhes se encarregam a acompanhar o ritmo, a seda esvoaçou com o cabelo, maravilhados ficaram meus olhos, a voz doce e a melodia simbólica se encarregaram dos ouvidos. Na décima flutuada, a dama e o cavalheiro já haviam conseguido arrancar-me cinquenta gotas de lagrimas. 
   Os olhos dele diziam que amavam os meus, os dela me convidavam para dentro de sua alma, eu sem saber o que fazer apenas chorava ao ver tanto talento transbordando. Duas vidas a caráter, vindas para provar, aproveitar, se envolver e envolver a audiência. A vontade que me deu foi de subir ao palco, transmitir a mesma sensação, o mesmo calor no olhar pra um próximo, provocar e sentir a dança, a música e a emoção. Aquela foi a última dança do cavalheiro, ele a aproveitou com as veias, as pulsações, com a alma... A doçura de sua vida encontrou a amargura da morte, ele só teve a oportunidade de comemorar 22 aniversários. Porém o vento da dança do casal, arrepiou minha existência eternamente.

 

Marcelo Luiz