Felíz día de muertos!

Felíz día de muertos!

 


   Dia de finados no Brasil é triste. No México é festivo. Segue um trecho do livro de minha autoria "Siga o seu coração: busque Chavela Vargas", onde conto um pouco do que vi, senti e descobri em minha primeira viagem ao país mais encantador que conheço.

 

   “Eu saí do Brasil para conhecer a tradição do dia dos mortos e naquela tarde visitei um dos lugares de fundamental importância para a data: o cemitério de Coyoacán. Era tudo que eu queria ver. Olhei para o local, tentando não relacioná-lo com o que eu conhecia da cultura brasileira, que era de muita tristeza, lágrimas, algumas flores e chuva (quase todos os anos, chove em São Paulo no dia de finados). Eu queria olhar de um novo ângulo para, finalmente, compreender a cultura mexicana. E confesso que foi muito fácil entender.

   Enquanto humanos, a nossa morte continua sendo apenas uma etapa na Terra. O fim de um ciclo da matéria. Mas as pessoas lidam de maneiras diferentes com isso. A diferença básica entre brasileiros e mexicanos é que nós, brasileiros, usamos a data para cultivar a dor da ausência.  Lembramos tudo que não dissemos, tudo que não fizemos e tudo o que a pessoa falecida deixou de presenciar. Isso inclui os familiares que se casaram e as crianças que nasceram. Por outras vezes, nos culpamos por não sentir saudade. Realmente como parece, esse é um dia para lamentar as atitudes que não tomamos enquanto a pessoa querida estava viva. Os mexicanos olham do ângulo oposto: eles celebram a vida que o ente querido teve. Celebram a vida e sua presença entre os vivos nos dias 1º e 02 de novembro. É dia dos mortos, mas é festa porque eles viveram.

 

      Em geral, a celebração no México é feita entre o dia 31 de outubro e 02 de novembro. No dia 31 de outubro, ao meio-dia, são esperados os “anjinhos”, que são as crianças falecidas. Já os adultos são esperados dia 1º de novembro, a uma da tarde. A celebração é repleta de sabores, que fizeram a alegria desta pessoa que regressa. São criados altares que permanecem em uma mesa em algum ambiente da casa, geralmente adornado com toalha branca, onde se colocam as oferendas.

Cada detalhe da decoração tem uma razão para estar presente. As pétalas das flores de Cempazuchitl são usadas devido à sua cor (amarelo ardente) para iluminar e orientar a alma do morto até sua casa. Sem dúvida, é a flor mais utilizada, porém não a única. Os altares infantis possuem flores brancas, que representam a pureza.

   Acredita-se que a fumaça do incenso e do copal subam pelo ar, inundando o espaço entre a terra e o céu para fazer a comunicação com Deus. As velas também são usadas para iluminar o caminho do falecido. Imagens religiosas e alguns objetos utilizados em vida também podem ser encontrados nos altares para que confortem os visitantes durante este breve retorno à Terra. São oferecidas as comidas e bebidas preferidas do falecido.

   Algo curioso é que a maioria dos mexicanos são católicos, e eles são capazes de unir, em perfeita harmonia, a religião e a tradição, sem desrespeitar nenhuma das duas.

 

   Vi o cemitério bem decorado. Os túmulos mais coloridos eram os de crianças, onde havia uma infinidade de brinquedos. Era lindo de se ver, mas muito triste. Caminhei por muito tempo no cemitério e saí de lá transformada. Eu já olhava tudo com novos olhos. A quantidade de informações e sentimentos que surgiam foram responsáveis por criar uma nova pessoa, que estava disposta a absorver tudo que pudesse daquela cultura magnífica. Segui pela Rua Centenário, passei próximo à Casa Azul e estive na Praça Hidalgo até o fim da tarde. Eu mal podia esperar para o dia seguinte e o mais importante da viagem.

 

O silêncio ensolarado daquele domingo, dia dois de novembro, me acordou cedo e me conduziu até Coyoacán. O vazio e a alegria do lugar já faziam parte de mim. E não tenho palavras para descrever aquele reencontro e a saudade que sentia daquele lugar que não conhecia. Era o lugar escolhido para passar o dia de finados. Fui ao cemitério novamente. Cheguei pouco antes do meio-dia e, para minha alegria, minutos depois começou uma missa para todos os mortos. A primeira missa a que assisti em espanhol. Linda! Os raios do sol cruzavam as árvores e clareavam de maneira curiosa todo o local. O lugar estava repleto de gente, incluindo três mariachis que cantavam por entre os túmulos. 

 

Thais Petranski

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