Flores Amarelas

Flores Amarelas

 

Nota da escritora: esse é um texto original e a reprodução dele não deve ser feita sem a minha autorização. Por favor, respeite meu trabalho.
 
 
Flores Amarelas
   O relógio já batia meia-noite. Da sacada, pude ouvi-lo tocar, ressonante e estrondoso, como sempre ficava àquela hora da noite. A casa estava quieta. A cidade estava morta. Não havia outros sons, exceto as badaladas frenéticas do relógio que, em meu interior, pareciam muito mais compridas que o normal.
   Naquele canto, sentada em uma cadeira de vime, eu observava o lado de fora, esperando que uma certa vida se mostrasse presente, em meio toda aquela escuridão. Porém eu morava longe, onde não existiam jogos nem diversão. A cidade estava fria; ou era eu quem não enxergava a sua vida ?
   Enfim, o relógio cessara o seu barulho. Pude ouvir, então, apenas o meu coração, que, infelizmente, ainda batia – no ritmo dos segundos; calmo, porém constante. A vida perdera o sentido; ou era eu quem não era capaz de enxergar a graça de existir ?
   A noite estava amena. Era primavera e, ao longe, eu era capaz de vislumbrar flores amareladas, presas a uma imponente árvore do outro lado da rua. As flores pareciam ser felizes... a noite parecia estar tranqüila, a Lua parecia estar sorrindo. Mas meus olhos, já inchados por causa do choro e roxos por causa das olheiras, pareciam os de uma morta.
   Foi quando, de repente, eu ouvi um barulho de chaves tinindo lá embaixo, na sala de visitas. Apurei a audição, mas não me movi de onde estava. Poderia apenas ser o vento... não queria ter falsas esperanças. Contudo, logo dei-me conta de que não ventava. Era uma gostosa noite de primavera, sem ventos, sem brisa; apenas com o frescor da noite.
   Então, um rangido de porta se abrindo fez-se ouvir e, em um salto, meu coração acelerou. Batia com força, desgovernado, como se tivesse ganhado a vida que há muito perdera; e, por alguns segundos, passou por minha mente a idéia de me levantar e correr até a sala, descendo as escadas com pressa e ansiedade. Idéia que, prontamente, foi abandonada, pois, apesar de enfraquecido, meu coração ainda era orgulhoso...
   Continuei a olhar para o lado de fora. Em um momento, tive a impressão de estar sendo observada, como se uma energia emanasse das flores à minha frente. As flores amarelas e vivas, que, agora, já não pareciam mais felizes, como se uma aura de lamúria tivesse se apossado delas. E, perdendo-me naquela tristeza das flores, demorei a perceber que alguns passos ressonavam no corredor, próximos à porta. Foi apenas quando um ranger de madeira velha percorreu o ar, que eu dei-me conta de que não estava mais sozinha... E, ainda assim, não queria acreditar. Não queria falsas esperanças...
   De repente, contudo, uma voz, conhecida, adorada e escondida no vácuo de minha memória, chegou aos meus ouvidos; e meu coração, que antes estava agitado, disparou como se fosse explodir. Seria emoção... ou medo de saber que aquela certa vida fazia-se presente ?
 - Cláudia...
   Um baque surdo atingiu o chão, quando uma pesada mala de viagem caiu das mãos de quem entrara. Eu ainda olhava para as flores... elas ainda estavam tristes, ao mesmo tempo em que, estranhamente, a noite de primavera já não parecia mais tão gostosa. Por que tanta amargura, se, aparentemente, aquele a quem eu sempre amei havia retornado para casa ?
Não levantei-me da cadeira de vime; porém, sem que meu coração orgulhoso pudesse conter-se mais, eu virei o rosto em direção à voz que me chamara.
   Como estava diferente ! Os olhos castanhos estavam caídos, os cabelos curtos estavam compridos e mal cortados, as roupas bonitas estavam rasgadas e sujas. Seria aquele Roger ou apenas um fantasma que viera me assombrar ?
   Talvez eu tivesse deixado o espanto refletir em minhas faces magras, ou talvez ele tenha conseguido ler meus pensamentos atordoados; só sei que, assim que o olhei, ele soltou um suspiro amargurado e disse:
 - Por grandes problemas eu passei e muitas desavenças eu enfrentei... porém, aqui estou eu. – e, inesperadamente, ajoelhou-se aos meus pés, logo que se arrastou para perto de mim – Cláudia... por favor, perdoe-me. – e, num movimento brusco, ele tomou-me uma das mãos, levando-a até a boca. Minha reação não foi a que eu esperava que fosse... ao invés de sentir-me feliz, e deixar que ele roçasse seu rosto em minha pele gelada, contente com a sua presença, apenas senti-me enojada, pensando no quanto aquela barba malfeita me machucava a pele delicada e sofrida.
   Sem que pudesse refletir, afastei minha mão de seu rosto, ao mesmo tempo em que ele olhava-me com dúvida e espanto nos olhos.
 - O que há, minha vida ? Por acaso não me quer mais ? Por acaso o tempo e a solidão foram capazes de afanar o sentimento quente que inundava seu peito de mulher ? – não pude responder. A verdade era: eu o amava. Sentia-me estranhamente feliz, pois sabia que ele havia retornado. Mas, ainda assim, meu coração orgulhoso não me permitia sorrir... e eu não sabia o porquê.
   De repente, virei o rosto para o lado de fora da sacada. Onde estava a noite de primavera ? Seriam apenas os meus olhos ou as flores pareciam murchas e secas ? Já não havia mais o amarelo berrante, que, outrora, aparecia com tanta intensidade no meio da noite escura... As flores estavam mortas... a cidade as havia matado; ou era a tristeza que as assolara ainda há pouco que as deixara sem vida ?
   Roger, então, arrastou-se até a minha frente, apertando-me as pernas descobertas e colocando o rosto entre meus joelhos. Senti que molhava-me o corpo, pois ele chorava como uma débil criança:
 - Por favor, Cláudia... eu sei, eu sei ! Fui um tolo; sim, eu fui ! Mas arrependo-me ! E aqui estou para pedir o seu perdão ! – e olhou para o meu rosto, que ainda voltava-se para o lado de fora. Parecia não se importar com a magreza quase cadavérica de minha face nem com as olheiras que inchavam minha fronte, pois disse com uma certeza que nunca ouvira em sua voz: - Perdoe-me, minha linda ! Sei que sou pouco para uma mulher como você, que sabe encantar uma cidade inteira com a pureza de seu olhar, com a alvura de sua pele, com seu andar balanceado e seus lindos cachos negros como a noite. Sei que mereço morrer, por ter abandonado rara peça, mas, por favor, perdoe-me ! Sem você eu não posso viver !
   Acredito ter sido guiada por uma amargura escondida em meu peito, pois, ao fim de suas palavras, deixei de encarar as flores amareladas e olhei para baixo, observando o rosto acabado daquele homem. Roger... Por que eu sentia tanta repulsa ? Olhei-o com escárnio, com um nojo repentino, vindo de não sei onde, que misturava-se com o alívio de vê-lo de novo.
Então, quase sem fôlego, soltei as palavras, que saíram de minha boca sem que eu tivesse ordenado:
 - Roger... por que não vamos dar uma volta ? – e menti – A noite de primavera está gostosa... fiquei tempo demais, trancada e esquecida, nessa casa. Quero caminhar no meio das casas silenciosas e sentir o cheiro doce das plantas.
   Mas, em meu interior, eu sabia que, por algum motivo, àquela noite as plantas não teriam um aroma adocicado, pois, apesar da presença de meu amado, eu, estranhamente, já não conseguia mais sentir amor...
   Andávamos em passos lentos. Eu à frente e ele em meu encalço, olhando-me o rosto como se eu fosse de ouro. Nos afastávamos aos poucos de minha casa, deixando as flores amarelas para trás. E, apesar disso, eu ainda era capaz de sentir a sua lamúria, que perseguia-me por onde quer que eu fosse.
   Estava de cabeça baixa; tinha vergonha de que, de repente, um dos vizinhos aparecesse às janelas, espreitando entre as cortinas, apenas para ver o estado lastimável daquela que havia se trancafiado em casa. Mas eles não apareciam nem espiavam, pois era tarde da noite e a cidade estava quase vazia.
   Então, mais uma vez, depois de um longo e ininterrupto silêncio, Roger soltou a voz e disse:
 - Cláudia... sei que não há desculpas. Sei que não tenho o direito de vir aqui, encarar-lhe a face com descarada humilhação e pedir-lhe o perdão. Sei que nada disso eu mereço, mas eu realmente te amo. Quero que saiba que, sem você, eu não tenho motivos para viver...
   Terminou com amargura, como se sentenciasse a própria alma à morte.
 - Por acaso pensa em matar-se ? – foi o que perguntei, incontida. Meu coração, que quase já não sentia amor, mas que ainda possuía resquícios do mesmo, começava a ser dominado pelo sadismo.
 - Por acaso existe solução ? Quando a abandonei, não sabia o que iria encontrar, mas tinha a certeza de que seria feliz. Esperava encontrar aventuras e amar mulheres impossíveis ! Mas nada disso veio a mim, e nada disso consegui com o esforço que fiz. Por isso estou acabado. – e, adiantando-se alguns passos, veio a parar à minha frente – Cláudia... – e, então, olhei-o, novamente, com escárnio. Por que eu ainda fazia isso ? – Por favor... não é possível que em seu coração não reste um mínimo de amor por mim...
   E restava... Eu o amava, Deus, sim, eu o amava ! Mas minha dor, acumulada em meu peito, conforme eu vegetava e apodrecia em minha própria casa repleta de lembranças, cresceu na proporção em que meu amor murchou; e, agora, meu coração era dominado pelos pensamentos ruins.
   Parado à minha frente, Roger, outrora belo, mostrava-se feio e desesperado. Pensava em matar-se ? E, por alguns segundos, passou-me pela cabeça a idéia de ajudá-lo a concretizar tal vontade. E, andando mais alguns passos, senti, aos poucos, que o envoltório de tristeza das flores já não me atingia, conforme eu me afastava cada vez mais de seu brilho apagado e amarelo.
 - Existe o perdão, Roger... Talvez eu seja capaz de redimir seus pecados; talvez eu seja capaz de esquecer os dias de isolamento que o sofrimento me causou; e talvez possamos voltar a ter uma vida normal. – minha voz saia falsa, como se tivesse sido ensaiada, o que me assustou, pois, em suma, tudo o que eu dizia era verdade, e, em meu íntimo, desejava poder voltar à minha vida de antes. Contudo, sentia que, apesar de muito distantes, a flores amarelas ainda me relavam com sua influência negativa, e era dessa energia que vinha toda a minha falsidade no tom de voz.
   Um sorriso perpassou os lábios rachados de meu amado. Então, senti que, em minha alma, a dor parecia estar dissipando-se aos poucos, pois, apesar de orgulhoso, meu coração ainda era capaz de sentir o calor.
 - Oh, minha bela, meu anjo que floresce como uma Deusa ! – exclamou Roger que, aproximando-se de mim, pegou meu rosto magro com as mãos calejadas e trouxe-me para um beijo. O beijo fora morno... eu sabia que gostava dele e que sentia falta de seus toques. Já não ouvia mais a lamúria das flores. A primavera tornara-se gostosa mais uma vez; e até pude sentir que minha palidez mórbida diminuía com a quentura da emoção.
   Por alguns momentos, ficamos ali parados. Ele abraçara-me em desespero, como uma criança abraça a mãe quando está com medo. Talvez tivesse medo de perder-me. Provavelmente ainda não acreditava que eu havia dito-lhe “sim” e que perdoara seus pecados.
   Demos meia volta na calçada e começamos a caminhar de mãos dadas. Roger já não me parecia mais tão feio; pelo contrário, parecia ter recuperado grande parte da beleza avassaladora que reinava em suas faces há um ano. E eu sentia-me viva, como se tivesse acabado de renascer.
   Já estávamos próximos à minha casa, quando, de repente, sem que eu pudesse impedir, uma tristeza inquietante apossou-se de mim. De reflexo, guiei meus olhos até a árvore do outro lado da rua, onde as flores amareladas voltaram a entrar no foco de minha vista. Elas ainda estavam murchas... não estavam felizes e, por algum motivo, conduziam-me para a depressão.
 - Venha, linda Cláudia. Quero poder te abraçar em nossa cama. – e Roger puxou-me de súbito, me levando para dentro da sala, tirando de minha visão as flores infelizes.
Subimos para o quarto, conforme ele enchia-me de beijos; beijos que, minutos atrás, poderiam inflar o meu desejo e me deixar louca de satisfação. Porém, essas carícias já não me agradavam mais. Novamente, senti uma inexplicável repulsa, que deixava-me com ânsia, fazendo-me afastar Roger. Confuso, ele perguntou:
 - O que há ? Por acaso não sente-se disposta ? Se não, compreendo. Não serei capaz de lhe forçar a nada. – e abraçou-me pelas costas.
   Eu virara meu rosto para o lado de fora, em direção à sacada do quarto. Era impossível evitar... como um ímã poderoso, as flores amarelas e vivas prendiam-me a atenção, fazendo com que eu não pudesse apreciar e desejar nada além delas. Com uma aura de fascinante melancolia, elas me enfeitiçavam e, por algum motivo, me impulsionavam, novamente, a pensamentos ruins.
   Afastando-me do homem às minhas costas, caminhei até a sacada, apoiando-me em seu parapeito de madeira escura. Roger não era capaz de perceber, pois não avistava os meus olhos, mas eu não conseguia desgrudar-me da árvore imponente à minha frente. Em um segundo repentino, a noite de primavera tornou-se fria novamente, deixando a formosura de lado e trazendo um arrepio de terror. As flores amareladas, sem brilho e quase sem cor, tristes e hipnotizantes, começaram, então, a me falar palavras de conforto; palavras estas que vinham de lugar nenhum, como se brotassem de meus pensamentos, plantadas pelas flores. Por um momento, não entendi o que pediam... contudo, logo seu desejo tornou-se claro para mim. E, lá no fundo, eu me vi perguntando: onde estaria o amor ? A repulsa e o ódio dominavam-me o peito, mas eu ainda me interrogava: por quê ? 
   Fechei os olhos. Uma sensação de quentura invadiu o meu corpo quando eu senti um toque suave e gentil em meu rosto. Não era o toque de Roger, com suas mãos calejadas, pois este encontrava-se distante, no fundo do quarto, confuso com o que me acontecia. Eram, na verdade, os toques de uma força invisível, que aparecia apenas quando eu fechava meus olhos. Pude ver uma mancha amarelada em frente a mim, que acariciava-me a pele. Percebi, então, de repente, que a mancha amarela dizia o que as flores haviam dito, mostrando que, estranhamente, a mancha era a energia das flores, que se materializara para me encontrar.
   Lindas palavras eu ouvi... que me tiravam o terror, que faziam com que a noite de primavera voltasse a ser o que era. E elas ainda me pediam, com doces argumentos, que eu lhes realizasse o desejo...
   Afastei-me da sacada, girando nos calcanhares e ficando em frente ao meu quarto. O homem da minha vida, agora sentado na cama, olhava-me de maneira indagadora. Parecia confuso... Mal sabia ele o que o futuro lhe reservara...
   Andei em sua direção. As olheiras em meu rosto estavam mais acentuadas, pois, sem motivos, eu chorava; um choro sem soluços, silencioso e agradável. Talvez, meu coração, que, apesar de orgulhoso, ainda continha um pouco de amor, dizia-me, em gritos de desespero, que eu não deveria atender ao pedido das flores amareladas. E, ainda assim, ao mesmo tempo, eu queria...
 - Cláudia ? Você está bem ? – perguntou-me Roger. Pude ver em seus olhos, já próximos de mim, a verdadeira preocupação. Ele se importava comigo e sentia-se infeliz por ver-me chorar. Mas a culpa não era inteiramente dele. A culpa também era minha, que não sabia me conter; e era das flores, que sabiam me persuadir.
   Abracei-o. Como ele estava ainda sentado na cama, seu rosto apertava-me na altura do seio, conforme ele me agarrava a cintura e eu passava a mão por seus cabelos. Senti que estavam sujos e maltratados. Por um segundo, senti a vontade de levá-lo para um banho gostoso; vontade que logo foi-se embora, dando lugar à ansiedade de acabar com tudo aquilo.
 - Aguarde um momento, meu amado. – disse eu, procurando não afetar a voz e revelar a falsidade que, mais uma vez, se instalara nela – Voltarei em um instante. Devo ir à cozinha e, enquanto faço isso, por favor, deite-se e descanse. Esta noite não estou disposta, mas desejo-lhe em meus braços, quando o sono vier me atingir.
 - Como quiser, minha senhora. Sabe que a amo, e que, por isso, faço o que me manda.
   Desvencilhando-me, então, de seus braços, desci as escadas em passos calmos.
   Lá estava ele. Roger encontrava-se em meu leito, encolhido como uma criança inocente no útero imaculado de sua mãe. Mas Roger não era inocente... nem a cama em que ele deitara estava livre de pecados. Seu rosto voltava-se para a parede oposta, não vendo-me quando entrei silenciosamente. Seria melhor assim... sem luta, sem resistência. Não queria causar-lhe dor, apesar do sadismo que nascia em meu peito; queria apenas realizar o desejo das flores.
   Já estava ao lado da cama, observando as costas dele. Fora, na sacada, o vento, então, soprou com leveza, e eu pude sentir que ainda possuía um toque de frieza. A árvore se mostrava ainda imponente, como um trono para as flores que erguia. E sorri, ouvindo, novamente, os murmúrios da mancha amarela, que dizia-me o que fazer.
   Ajoelhei-me no colchão. Um punhal de ferro maciço estava em minhas mãos. Ergui-o, e observei com afeto o rosto de meu amado, que adormecera e nem sabia o que acontecia. Como era lindo ! Mesmo acabado, sofrido e maltrapilho como se encontrava, ainda mantinha a beleza que o assolara há um ano. Seria uma triste perda, pensei.
   Foi um movimento rápido, brusco. Nem ao menos sei de onde fui capaz de retirar tamanha força, pois estava fraca e quase sem vida; e, ainda assim, desferi um golpe fatal. Apenas um... no lugar certeiro: a cabeça, onde os pensamentos ruins nasciam e, agora, morriam também. O lençol foi tingido de vermelho. O corpo parara de respirar. E eu sentia-me aliviada, embora uma estranha melancolia tivesse se apossado de uma parte de meu coração.
   Olhei para a sacada. A noite de primavera estava amena, gostosa e cheia de vida. As flores amarelas recobraram o brilho, e tornaram-se tão belas quanto antes da chegada de Roger. Sentei-me na cadeira de vime. A cidade estava morta, mas eu estava viva. O relógio da sala deu uma única badalada, revelando que já era uma da manhã. 
   As flores sorriram para mim, e eu lhes sorri de volta. Talvez, algum dia, o remorso viesse a me matar, mas eu sabia que, contanto que eu estivesse ali, em frente àquela sacada, contemplando as flores da minha vida, a dor jamais poderia me alcançar.
Percebi, então, que, talvez, aquelas fossem as Flores da Loucura e da Morte, que seduziram-me e me convenceram a tirar a vida de um traidor. E, quem sabe um dia, elas também não venham a me enlouquecer e acabar com a minha própria alma ?
   Flores amarelas, flores amarelas... foram vocês que me libertaram e, por isso, não as temo...

 
Ayla Pupo